Sunday, December 30, 2007

QUADRAS À "DESGARRADA"

Na Literatura Oral Tradicional integram-se enunciados cuja divulgação se faz por via da transmissão oral, por vezes durante séculos, de geração para geração, de comunidade para comunidade, de indivíduo para indivíduo — os contos e as quadras populares, as cantigas infantis, os provérbios, as adivinhas, as anedotas (o género mais vivo) são alguns desses enunciados de que todos nós, certamente, já fomos um dia transmissores.
De origem mais ou menos remota e o maior número das vezes de autor anónimo, estes enunciados registam-se na memória dos povos e fazem parte do conjunto das tradições, usos e costumes populares de um país. Podemos dizer que integram um conjunto vasto de tradições a par das festas, das danças, dos jogos, das crenças e das superstições, das rezas, da culinária... A produção e transmissão dos textos da literatura oral encontram-se, normalmente, associadas a outras práticas populares e quotidianas: pensemos, por exemplo, nas quadras “à desgarrada” em festas de aldeia, nas “Janeiras” cantadas de porta em porta em certas regiões, nas “rezas” entoadas em dia de trovoada, nos “romances” recitados por grupos de ceifeiros, ritmando o trabalho, nos contos de fadas que nos embalavam à hora de adormecer ou nas anedotas que contamos numa reunião de amigos. (Guia de Aprendizagem. Português. Ensino Secundário, Ed. ME, 1996 - adaptado)
Neste espaço vamos tentar iniciar hoje a publicitação de " quadras à desgararda"


1) O vinho que aqui tenho
é filho da cepa torta
aos homens faz cantar o fado
às mulheres errar a porta

2) Venham copos e venha o vinho
venha mais uma canecada
o dinheiro paga tudo
não se fica a dever nada

3) Não há pão como o de trigo
nem carne como a de carneiro
não há vinho como o tinto
nem amor como o primeiro

Friday, December 14, 2007

A SOPA DE PEDRA ( a verdadeira)

Trata-se [o frade] de um conto tradicional português, recolhido por Teófilo Braga, que mostra como surgiu, segundo a tradição popular, a sopa de pedra. Hoje, este conto anda de mãos dadas com uma história de família, que começou há cerca de 40 anos, no local onde se situa actualmente o restaurante O Toucinho. Este local era antigamente uma mercearia. Os donos eram pessoas que gostavam muito de conviver e, a certa altura, começaram a convidar os fornecedores da mercearia para o almoço, para que não seguissem viagem de estômago vazio. Certo dia, o almoço era uma sopa escura, saborosa, mas sem nome. Na semana seguinte, todos quiseram deliciar-se novamente com o saboroso manjar. Os donos já não sabiam que sopa era. Foi então que os convidados lembraram:- “Era aquela sopa escura, que tinha uma cor parecida com a cor das pedras da rua.”
Hélia Costa, dona do restaurante O Toucinho, conta que o nome da sopa surgiu do facto de, antigamente, as ruas da zona serem todas de pedra muito escura. “Posteriormente, por graça, começámos a pôr a pedra na sopa.” “Foi a minha avó, Mariana, que inventou a sopa de pedra.” Foi ela que há 40 anos fez o tal almoço, que tanto agradou aos convidados. Actualmente, com 91 anos de idade, D. Mariana levanta-se todos os dias às 5 da manhã, para pôr a panela ao lume. Hélia Costa assegura que “esta sopa não faz mal a ninguém. Não tem nada de refogados.” Diariamente, o ritual é o mesmo. “A minha avó põe a panela ao lume, logo com o feijão no fundo. Depois a cebola, alho, um ramo grande de louro, o chispe devidamente salgado, a orelha de porco também salgada, o toucinho, uma quantidade boa de colorau, pimenta, um bocadinho de piri-piri e água. Depois põe a cozer. A meio da cozedura põem-se os enchidos, o chouriço, a morcela e a farinheira. Não podem estar tanto tempo na panela, porque cozem muito mais depressa. Quando a carne está cozida, retira-se, corta-se tudo em pequenos pedaços e deixa-se o feijão cozer um bocadinho mais. Depois de cozido mistura-se a batata, rectificam-se os temperos de sal e piri-piri e está feito. No final, leva um molho de coentros picados.” De facto, parece simples a confecção deste verdadeiro pitéu. Mas existem segredos que não se contam. Hélia Costa afirma que hoje já se vê sopa de pedra em todo o lado, mas parte dela é adulterada, no que diz respeito à receita. Histórias à parte, a verdadeira sopa de pedra come-se em Almeirim. É um prato saboroso, que constitui uma verdadeira refeição, apreciada por todos, de norte a sul do país e até mesmo do estrangeiro. ( ouvi esta narração ao Dr. Eurico no decorrer da homenagem que foi prestada ao seu criador )